Artigos

AS ACADEMIAS DA PALESTINA (aprox. 70-450 E.C.)


"Uma citação no momento certo é como pão para os famintos" 
Talmud 

   
    No quarto ano da revolta contra Floro, o ano 70, a possibilidade de que os judeus fossem definitivamente exterminados era grande. Notando a iminência da derrota judaica, Johanan Ben Zakai formulou um plano para manter o judaísmo forte. Primeiramente, ele se fingiu de morto para sair de Jerusalém. Chegando a um local seguro, saiu do caixão e foi falar com Vespasiano.

    No encontro, Johanan pediu o direito de abrir uma escola na cidade de Yavne. Como Johanan era um homem influente entre os judeus e poderia apaziguar os ânimos entre os judeus moderados, Vespasiano prontamente aceitou. O objetivo da escola era manter o povo unido e com coragem após a derrota e preservar os pontos mais importantes do judaísmo.

    Além do estudo, um dos principais objetivos da Academia de Yavne era criar instituições para substituir aquelas destruídas pelos romanos. O Sinédrio, órgão legislativo e judiciário judaico havia sido proibido de se reunir. Silenciosamente, Johanan reuniu 71 eruditos que, mesmo sem ter o poder oficial, já que este estava com Roma, deveria servir como autoridade aos judeus em geral, mesmo sem ter o poder de fazer cumprir suas decisões.

    Outra substituição foi a troca do templo de Jerusalém por sinagogas. Algumas rezas e orações que eram comumente feitas no templo passaram para as sinagogas, como o soar do Shofar em Rosh Hashaná e a benção sacerdotal.

    Enquanto existia uma nação e terra sob o comando judaico, a existência de grupos com práticas religiosas diferentes, como Saduceus e Fariseus, não constituíam um problema. Contudo, com a dispersão, assegurar práticas uniformes gerava laços de união entre comunidades distantes. Assim, formou-se o Bet Din, cujo objetivo era diminuir ao máximo as diferenças de práticas religiosas entre as várias comunidades. O Nasi (chefe), do Bet Din, era chamado pelo título de Raban.

    Passados alguns anos, os novos governantes de Roma não buscavam mais destruir o judaísmo. Com isso, deram autoridade ao Bet Din para comandar as questões internas. O Bet Din era o governo, exceto em questões de impostos e atividades semelhantes. Além desse poder na região, tinha muita influência nas comunidades judaicas ao longo do império, sendo uma espécie de autoridade moral.

    Com a revolta de Bar Cochba, novamente o poder do Bet Din foi suspenso e o estudo do judaísmo proibido. Em 150, com outra mudança no poder em Roma, o Bet Din volta a funcionar sob a liderança de Simão II, nessa época torna-se mais evidente que o judaísmo pode sobreviver, “Não pela guerra, nem pelo Poder, mas pelo Meu espírito”.

    Nessa época, a Torah era largamente interpretada pelos rabinos, mas nunca essas interpretações eram escritas, pois era considerado um sacrilégio um livro que a complementasse. Essas interpretações eram conhecidas com Lei Oral e eram passadas nas escolas de rabinos. Devido ao tempo durante o qual as escolas ficaram paradas devido à revolta de Bar Cochba, se tornou grande o receio de que essas interpretações se perdessem.

    Quando Simão II morreu, este foi sucedido por seu filho Judá de inteligência incrível e que ficou conhecido como “Judá, o Príncipe”. Seu prestígio e poder cresceram ainda mais quando ele foi nomeado por Roma chefe hereditário do povo judeu, com o título de Patriarca.

    A grande obra que Judá empreendeu foi a Mishná. Ela é um código de leis, que está organizada de acordo com temas. São seis seções subdivididas em tratados e ordens. Cabe notar que não apenas as leis estão escritas na Mishná, mas há também capítulos que falam sobre ética e princípios que devem guiar a consciência de cada judeu.

    O período compreendido entre Johanan Ben Zakai e Judá é conhecido como era Tanaítica (Taná significa estudante), foi quando as instituições judaicas deixaram de ser nacionais e passaram a ser religiosas. Foi também importante por ser a época em que é feita a Mishná, virando esta acompanhante da Torah e tornando o povo judeu, mais do que nunca, “O povo do livro”.

    Os descendentes de Judá continuaram sendo os Patriarcas, mas perdendo progressivamente sua influência, já que não tinham tanta cultura e capacidade. No ano de 425, Gamaliel VI morreu sem deixar herdeiros. Neste momento, o novo patriarca deveria ser escolhido por Roma, mas, devido à influência de bispos cristãos, em 429, os romanos decidiram definitivamente acabar com o patriarcado.

    No ano de 361, um fato inesperado trouxe esperança para os judeus. Juliano havia se tornado regente único do império romano e escreveu uma carta amistosa aos judeus, revogando leis impostas contra o judaísmo e prometendo reconstruir o templo de Jerusalém. Porém, ele reinou por apenas 2 anos, morrendo no campo de batalha e, com ele, a possibilidade de reconstrução acabou.

    Nos anos entre o patriarcado de Judá e o fim do patriarcado, ocorreu a criação da Guemará, livro em que se estudava e interpretava a Mishnah. Devido às dificuldades que os judeus enfrentavam sob o domínio Romano, as interpretações e discussões não foram completamente compiladas, deixando a Guemará, de certa maneira, incompleta. O conjunto da obra Mishná e Guemará ganhou o nome de Talmud. Hoje, chamamos o Talmud feito na Palestina de Talmud Ierushalmi, para diferenciá-lo de uma obra similar compilada pelos babilônios, chamado Talmud Babli.

    Ao longo do patriarcado, vários dias sombrios passaram sobre os judeus da Palestina. Isso levou a grandes emigrações. Assim, quando o patriarcado foi finalmente extinto, a comunidade judaica da Palestina já não era mais tão significativa e, definitivamente o centro da cultura e político dos judeus havia passado para a Babilônia.

    Assim, após a Palestina ter sido o centro político e religioso dos judeus por 1500 anos, ela finalmente deixava este posto, mas legando aos judeus e ao judaísmo muitas das leis judaicas que seguimos até hoje, livros maravilhosos, poesias, romances, o Talmud Ierushalmi e, principalmente, grande parte da Bíblia. Além disso, a Palestina legou aos judeus a eterna saudade. A vontade de retornar à Terra prometida permaneceu e permanece nos corações dos judeus até hoje, estando esta esperança de volta a Israel relacionada a uma época de justiça e paz.