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ASSIMILAÇÃO, NACIONALISMO, SIONISMO


por Abba Eban (1915-2002), professor da Universidade de Yale (US), membro da ONU e do Knesset.

 

(…) reescreveu seu trabalho e o intitulou De ]udenstaat - "O Estado Judeu." Escreveu Herzl: “A idéia que desenvolvi neste panfleto é uma idéia muito antiga; é a restauração do Estado Judeu." Esse país seria a resposta ao anti-semitismo, aos gritos de "Juden raus!". Herzl esboçou as funções materiais, práticas a serem executadas pelo Estado. Ignorou a questão das características nacionais ou culturais que deveria assumir, e não  associou necessariamente com Sião nem especificou o hebraico para sua língua. Descreveu minuciosarnente as condições prévias para a criação do estado soberano: a necessidade de um congresso de representantes judeus reconhecido coma porta-voz oficial do judaísmo mundial, de dinheiro a ser levantado por uma companhia financeira judaica, de engenheiros e técnicos para tornarem o Estado um modelo de moderna eficiência industrial. Concluía assim:

    “Por isso acredito que uma geração admirável de judeus aparecerá. Os Macabeus ressuscitarão. Permitam-me repetir ainda uma vez minhas palavras iniciais. Os judeus que o quiserem farão o seu Estado. Viveremos finalmente como homens livres em nosso próprio solo e morreremos tranqüilamente em nossos próprios lares. O mundo será libertado com a nossa liberdade, enriquecido com nossa riqueza, engrandecido com nossa grandeza. E tudo aquilo que tentaremos ali realizar para nosso próprio bem-estar estaremos reagindo poderosa e beneficamente para o bem da humanidade.”

Este ardente documento messiânico, publicado em 1896, rompeu sobre o mundo como um raio. As reações foram variadas, em grande número, e ruidosas. A imprensa alemã, judaica e não-judaica, ridicularizou os "escapados Macabeus" e Herzl, um Júlio Verne judeu, cujo sonho fantástico só poderia ter sido produto de uma mente que se tornara desconjunta por entusiasmos judaicos. Sionistas desconfiaram deste escritor desconhecido que rejeitava a língua hebraica e ignorava seus precessores, especialmente Hess e Pinsker. Mas a verdade era que Herzl desconhecia por completo a existência destes homens. (Disse ele a Wolffsohn, posteriormente, que poderia nunca ter escrito seu próprio livro se tivesse conhecido a "Auto-Emancipação" de Pinsker.) Herzl fora impelido a difundir suas idéias na crença de que eram originais e era esse frescor de imaginação que lhes dava sua força. Muitos ficaram profundamente emocionados pelo Der ]udenstaat. Wolffsohn escreveu que após lê-lo tornara-se "outro homem". A juventude sionista ficou particularmente impressionada, sua reação é relembrada por Chaim Weizmann em sua autobiografia:

“Era uma manifestação que veio como um raio em céu azul. Nunca antes ouvimos o nome Herzl, ou talvez houvesse chegado à nossa atenção, só para se perder entre os de outros jornalistas e escritores de folhetins. Basicamente, o Estado Judeu não continha uma única idéia nova para nós. Aquilo que tanto alarmou a burguesia judaica e provocou o ressentimento e escárnio dos rabinos ocidentais, fora há muito a substância de nossa tradição sionista. Observamos, também, que esse Herzl não fazia alusão em seu pequeno livro aos seus antecessores neste campo, a Moisés Hess, Leon Pinsker e Nathan B. Birnbaum. . . Aparentemente Herzl não sabia da existência da Chibat Tzion; Ele não mencionava a Palestina e ignorava a língua hebraica. Porém, o efeito produzido por “0 Estado Judeu” foi profunda. Não as idéias mas a personalidade que se achava por detrás delas e que nos atraía. Aqui havia coragem, clareza e energia. O próprio fato deste ocidental vir a nós livre de nossos preconceitos tinha sua atração… Estávamos certos em nossa apreciação instintiva de que do Judenstaat emergirá mais que um conceito, surgirá  uma personalidade histórica. ...O que deu grandeza ao nome de Herzl e seu papel como homem de ação, como fundador do Congresso Sionista e como um exemplo de coragem e dedicação.”

De toda parte vieram apelos a Herzl para assumir a lide­rança dos judeus, não era ele o homem que dera expressão vigorosa aos sentimentos mais profundos do povo judeu e que os instigara a lutar por sua liberdade definitiva? Herzl ficou totalmente absorvido na tarefa de realizar seu plano. Apelou por auxílio à aristocracia influente, ao Grão-Duque de Baden, ao governo turco. Em entrevistas privadas conseguiu encantar a lordes por sua aparência imponente - barba espessa e olhos negros - mas não fez convencê-los ou ter seu apoio, assim como não conseguiu, na França, convencer o Barão Edmond de Rothschild, o homem que fora até então o sustentáculo do ishuv e do movimento para ajuda própria na Terra de Israel. E foi, na verdade, a recusa do Barão de conceder apoio moral ou financeiro que fez Herzl compreender que nada obteria de cima. Sua única esperança estava nas massas a qual teria de despertar com propaganda. "Organizemos imediatamente nossas massas", decidiu. E assim nasceu o sionismo político.

Em um ponto Herzl mostrou-se inflexível - a convocação de um Congresso Judaico. "O Congresso se realizará". A audácia desta idéia causou grande consternação entre o judaísmo europeu. Ele queria condenar os judeus à morte expondo-os como nação dentro de uma nação - como os anti-semitas, que apenas esperavam pelo bom pretexto para destruí-los, sem­pIe haviam alegado? Herzl foi adiante. Com seus próprios recursos fundou um seminário, Die Welt, para defesa e propagação de suas idéias. Conforme relatou mais tarde um dos participantes da conferência preliminar: “O Congresso foi feito por Herzl sozinho. Foram seu dinheiro e seu trabalho que o levaram a existir."Em 29 de agosto de 1897 o Congresso Sionista reuniu-se na Basiléia. Era a primeira assembléia oficial e mundial de judeus desde sua dispersão e era obra de um só homem. Cento e noventa e sete delegados compareceram a esta Assembléia. Vieram da Europa Oriental e Ocidental, da Inglaterra, América e Argélia - moços e velhos, ortodoxos e reformistas, capitalistas e socialistas. Quando os delegados entraram na grande ala de conferências, avistaram as palavras “Zionisten Kongress” e uma bandeira branca com duas listras azuis e a estrela de David (idealizada por Wolffsohn). Herzl dava grande importância à necessidade de se ter uma bandeira. "É com uma bandeira que as pessoas são levadas para onde quer que se deseje, até para a Terra Prometida. Por uma bandeira os homens vivem e morrem. . ."

Então Herzl levantou-se, "uma figura maravilhosa e sublime", "um herdeiro ressuscitado da Casa de David, vestido de lenda, fantasia e beleza. Todos estavam sentados imóveis na presença de um milagre. E na realidade não era um milagre o que víamos?" Herzl expressou seu plano conforme o esboçara no ]udenstaat, mas agora salientava que a pátria seria a Palestina, publicamente reconhecida e legalmente assegura­da. Durante o Congresso foi criada uma Organização Sionista Mundial, tendo Herzl como presidente; adotaram-se uma bandeira judaica e um hino nacional, Hatikvá (A Esperança); Instituiu-se um Comitê Executivo com sede em Viena e redigiram-se resoluções para seu programa. Com essa nota de atividade prática, entre exclamações de alegria e compromissos de dedicação, chegou ao fim o fato histórico. As rodas haviam sido postas em movimento. Um indivíduo extraordinário, poderoso e enérgico havia revelado as fontes latentes da unidade judaica e dado expressão aos recursos ocultos dos judeus como povo, um só povo, onde quer que estivesse vivendo. Para Herzl o Congresso causou uma impressão vital; surpreendeu-o a força do judaísmo russo:

“E então surgiu diante de nossos olhos um judaísmo russo de cuja força nem havíamos suspeitado. Setenta de nossos delegados vieram da Rússia, e estava claro para todos nós que eles representavam as opiniões e sentimentos dos cinco milhões de judeus daquele país. E que humilhação para nós, que havíamos tido como certa a nossa superioridade! Todos esses professores, médicos, advogados, industriais, engenheiros e comerciantes estão em um nível educacional que, sem dúvida, não é inferior ao nosso. Quase todos dominam duas ou três línguas, e que são homens de capacidade em suas respectivas especialidades é comprovado pelo simples fato de terem sido bem sucedidos em um país onde o sucesso é particularmente restrito aos judeus. Eles possuem aquela unidade interior que desapareceu entre nós, ocidentais. Estão impregna­dos de sentimento nacional judaico, embora sem demonstrar qualquer intolerância e estreiteza nacional. Não se acham torturados pela idéia de assimilação, sua natureza essencial sendo simples e não-fragmentada. ... E, no entanto, são judeus de gueto! O cínico gueto de nossos dias! Vendo-os, compreendemos onde nossos antepassados buscaram a força para perdurar nos tempos mais amargos”.

Após o Congresso lançou-se Herzl a execução de seu pro­grama. Era ele cuja força de vontade e vigor eram proporcionais a grandeza da causa. Estava então decidido a obter do governo turco uma carta que legalizasse a colonização judaica na Palestina numa base corporativa. Acreditava poder alcançá-la através de negociações e cartadas diplomáticas. Mas as vagas promessas que lhe fizeram em suas entrevistas não foram cumpridas. Dirigiu suas primeiras tentativas ao Kaiser Guilherme II da Alemanha, única aliada da Turquia na Europa. Herzl conseguiu sua entrevista com Guilherme II em outubro de 1898. Desde o início, o preconceito anti-semita do Kaiser e seus auxiliares ficou evidente. Politicamente, porém, o Kaiser era favorável ao plano de Herzl, já que era muito conveniente remover "certos elementos" para a Palestina. O Kaiser prometeu levar a questão de uma "companhia territorial" à consideração do Sultão em oportunidade adequada. Pouco depois encontrou-se Herzl novamente com o Kaiser em solo palestino, e mais uma vez Guilherme II expressou sua aprovação ao plano de Herzl. Este, durante meses, esperou febrilmente por alguma nova manifestação. Não veio nenhuma. Havia sido esta a primeira visita de Herzl à Palestina, e ele ficara profundamente emocionado. Seguido por detetives turcos, visitou Mikveh Israel, Rishon Le Tzion, Nes Tzionah e Rechovot, onde a recepção entusiasmada que lhe foi feita em meio a canções hebraicas e exclamações de Heidad Hoch Herzl trouxe lágrimas aos seus olhos. Viu Herzl a terrível necessidade de água nessa terra ressecada. A imundice na parte oriental de Jerusalém deprimiu-o, e ele expressou um veemente desejo de criar "uma gloriosa Nova Jerusalém".

Herzl então esforçou-se durante dias  (1899-1901) para entrar em contato direto com o Sultão Abdul Hamid H., o que conseguiu subornando gananciosos funcionários turcos a preços elevadíssimos. Em maio de 1901 foi-lhe concedida uma entrevista de duas horas. Sugeriu Herzl ao governante turco que talvez os ricos banqueiros judeus da Europa ajudassem a Turquia a custear suas muitas dívidas em troca de uma carta para colonização judaica na Palestina. O Sultão pareceu interessado. Mas por parte de Herzl a proposta fora feita inteiramente sem base. Não tinha ele promessas de apoio financeiro da Europa. Para esta carta, tentou angariar a necessária ajuda financeira. Fracassou em toda parte e seu desalento chegou à repugnância. Menos de um ano depois Herzl encontrou-se novamente com o Sultão de quem tentou extrair uma oferta precisa. Desta vez o Sultão impôs condições para a imigração judaica: teria de ser dispersa e não grupal. Herzl depositou três milhões de francos em bancos turcos como penhor de boa-fé e para estimular o apetite do Sultão. Mas, como no caso da Alemanha, nada se concretizou. Finalmente, Herzl compreendeu que o Sultão apenas se aproveitara dele e estava usando a ameaça de um empréstimo judeu para obter melhores taxas de juros dos credores franceses. Herzl ficou amargamente desiludido, pensando seria­mente em renunciar à presidência.

A novela de Herzl,  Altneuland, apareceu em 1902. Sua finalidade era ilustrar o futuro da Palestina, mostrar "quanta justiça, bondade e beleza podem ser criadas na terra se houver para isso uma vontade honesta". Ele termina o livro assim:

“Mas se não o quiserdes, então tudo que vos relatei continuará sendo ficção... Sonhos não são tão diferentes de ações como muitos acreditam. Todas as ações dos homens foram a princípio apenas sonhos e no fim voltam a ser sonhos.”

Contudo, não obstante essa nota de fracasso, as realizações de Herzl prevaleceram de muito sobre seus reveses. De ano a ano aumentava o número de pessoas que compareciam aos Congressos Sionistas, assim como o interesse geral pela atividade sionista. No tempo do II Congresso Sionista, o número de grupos que se haviam filiado à Organização elevara-se a 913, o triplo em relação ao ano anterior. O número de delegados foi 400 e a representação da imprensa também foi maior. O movimento estava adquirindo status e reconhecimento mundial. Herzl foi aceito como seu líder e espírito dirigente. Em 1901 foi fundado o Jewish Colonial Trust; embora até 1904 houvesse vendido apenas um milhão de dólares em ações (para grande tristeza de Herzl e não obstante seus incessantes esforços), dele surgiu a Anglo-Palestine Company (que, em 1950, tornou-se o Bank Leumi Le-Israel) ­uma instituição que desempenhou um papel importante no desenvolvimento da Palestina. No V Congresso, em 1901, foi criado o Fundo Nacional Judaico (Keren Kaiemet Le-Israel), que se restringiria a comprar, desenvolver e reflorestar terras na Palestina, para se tornarem propriedade inalienável dos judeus. Foi este Fundo que mais tarde possibilitou as cooperativas agrícolas socializadas experimentais. Nos Congressos, Herzl recebia invariavelmente reações entusiasmadas, não obstante à crescente impaciência e descontentamento dos delegados com seu fracasso em apresentar resultados rápidos e espetaculares. O próprio Herzl tinha consciência da discrepância entre sua vontade e suas realizações. Ele via, bem claramente, que longe estava de sua meta - a Carta para a Palestina. Sobre isso escreveu Weizmann:

    “Herzl falava em termos amplos - de reconhecimento internacional, de uma carta para a Palestina, de imigração em vasta escala. Mas com o passar dos anos o efeito se desgastava, e nada restava senão as frases. Herzl havia visto o Sultão, ele havia visto o Kaiser, havia visto o Secretário do Exterior britânico. Iria ver este ou aquele homem importante. E o resultado prático era nulo. Era assim inevitável que nos tornássemos céticos quanto a estas negociações nebulosas.”

Foi esse fracasso em alcançar resultados positivos que levou Herzl a proposta de uma pátria outra que não a Palestina. Sua sugestão de colonização em El Arish, na península do Sinai (que era vizinha da Palestina e tinha associações históricas para os judeus), foi apresentada por Herzl a Lorde Nathan Rothschild, membro do Parlamento britânico. Rothschild não deixou de se impressionar e obteve para Herzl um encontro com Joseph Chamberlain, o então Secretário das Colônias. Marcou isso o início de muitas discussões longas com os britânicos a respeito de um lar para os judeus. O plano de El Arish não deu em nada por causa de divergências entre os governos egípcio e turco. Freneticamente passou então Herzl a procurar uma pátria, principalmente devido aos relatos chegados ao Ocidente sobre o sofrimento dos judeus romenos e as manifestações anti­judaicas em Kishinev (Rússia). Assim, o VI Congresso, submeteu aos delegados a idéia de uma pátria em Uganda, conforme oferecido pelo governo britânico. De início, a magnanimidade da oferta britânica "eclipsou todas as demais considerações". Especificou Herzl que isso não era uma substituição de sítio. Disse ele :"e deve continuar sendo, uma medida de emergência, que se destina a vir em auxílio dos sempre in­capazes empreendimentos filantrópicos e evitar a perda daqueles fragmentos separados de nosso povo." O que Herzl não percebeu, conforme as palavras de Weizmann, foi que "os judeus da Rússia, com todos os seus sofrimentos, não eram capazes de transferir seus sonhos e anseios da terra de seus antepassados para qualquer outro território". Adveio uma bata­lha. Com a aprovação, por 298 a 178 votos, de um plano para o envio de uma comissão exploratória à Uganda, os delegados russos retiraram-se. O possível colapso e desintegração do movimento sionista apresentava-se iminente e ameaçador.

    Mas num ponto Herzl sempre insistira - unidade, a todo custo, sem unidade os judeus nada conseguiriam. Estarrecido com a atitude russa, Herzl declarou, "Esta gente está com a corda no pescoço e ainda assim recusam!" Nos dias subseqüentes a divergência ampliou-se. Os delegados russos recusa­ram-se a aceitar qualquer desvio do Programa da Basiléia, achando que a tarefa do sionismo era alcançar seu objetivo final - um lar na Palestina - e não preocupar-se com o sofrimento temporário das massas judaicas. Uma profunda depressão pairava sobre todos. Herzl foi chamado de "traidor". Pediu ele uma oportunidade para explicar sua posição aos rebeldes: "A minha situação é esta. Dinheiro vocês não me dão. Resta a diplomacia, mas nos últimos dois dias eu vi como vocês me ajudam, como me apóiam em minhas atividades diplomáticas... E teria eu violado o Programa da Basiléia? Jamais! Sempre me baseei, e ainda me baseio no Programa da Basiléia, mas preciso que tenham fé em mim, e não desconfiança…" Os líderes russos, após uma conferência realizada em Kharkov, apresentaram a Herzl a exigência de não submeter ao Congresso novos projetos territoriais exceto se relaciona­dos com a Palestina e Síria. A luta só terminou após uma reunião, convocada por Herzl, do Comitê Executivo (1904). Decidiu ele fechar a brecha e desanuviar a atmosfera:

    “Queremos o crescimento contínuo do sionismo, queremos o sionismo como o representante do povo. Por que quere­mos isso? Porque acreditamos não poder atingir nossa meta sem grandes forças e essas não são encontradas numa federação de pequenas sociedades. Uma tal federação vocês a tiveram vinte anos atrás, e vocês sempre me dizem que já eram sionistas há vinte e vinte e cinco anos. Estão sempre me jogando isso na cara. Mas o que provam com isso? O que foram capazes de realizar enquanto não tinham o sionismo político? Vocês viviam em pequenos grupos e arrecadavam dinheiro. Suas intenções, sem dúvida, eram magníficas, seu idealismo inatacável. Não obstante, não puderam conseguir nada porque não conheciam o caminho que levava ao objetivo. Esse caminho é a organização do povo e seu órgão é o Congresso.”

    Esta conferência de reconciliação foi a última realização de Herzl e no plano das relações humanas permanece como uma de suas melhores. Para ele pessoalmente, o fim estava próximo. Estivera muito doente antes da conferência e somente pela sua determinação reunira força suficiente para com­parecer na mesma. Depois de terminada, foi levado apressada­mente para Franzensbad para um repouso de seis semanas. Herzl tinha plena consciência de que a morte estava próxima. "Não há tempo para gracejos", disse ele a um companheiro, "agora é mesmo sério... não há tempo a perder. São as últimas semanas ou dias. Temos de nos apressar. . ." Nem durante essas semanas, em que sofria de dores terríveis e es­tava prestes a morrer deixou Herzl de trabalhar. Escreveu cartas, manteve entrevistas. Contorcido por acessos de tosse, escarrando sangue, prosseguiu Herzl em sua luta. Em 3 de julho, em conseqüência de um ataque de pneumonia, faleceu, com a idade de 44 anos. Seu enterro foi um testamento ao profundo impacto que Herzl tivera sobre as massas judaicas. Seis mil judeus acompanharam-no ao túmulo, de luto por um herói nacional. A notícia de sua morte abalou, de fato, o mundo judaico. Mesmo enquanto vivo, as massas haviam visto seus anseios refletidos nele. Viram nele seu redentor, um messias que as conduziria das trevas à luz, até a Terra Prometida. Achad Ha'am, um de seus críticos mais veementes, escreveu sobre a morte de Herzl:

    “O Herzl vivo, real disse e fez muita coisa sujeita a dúvidas... Mas a figura ideal de Herzl que está sendo criada diante de nossos olhos na mente popular - que esplendida visão será quão poderosa sua influência para limpar essa magna mente da nódoa da galut, despertá-la para um senso de dignidade nacional e estimular seu desejo de uma verdadeira vida nacional. O povo o tomará a personificação de seu próprio ideal nacional, em todo seu brilho e pureza e extrairá dele força e coragem para continuar a lutar, incansavelmente, no difícil caminho de sua história. Herzl nos deu o Congresso, a Organização, o Banco, o Fundo Nacional... Mas uma coisa Herzl nos deu involuntariamente e que é, talvez, maior do que tudo que ele fez com propósito deliberado. Ele nos deu ele próprio, para ser o tema de nosso Hino de Renascimento, um tema que a imaginação pode pegar e adornar com todos os atributos necessários para fazer um herói nacional hebreu, clamando nossas aspirações nacionais em sua verdadeira forma.”

    Através de Herzl o povo judeu superou seu papel passivo de sofredor resignado. Os judeus começaram a moldar sua própria vida e a tomar o futuro em suas próprias mãos. Herzl devolveu-lhes força, coragem e determinação, entregando-se de corpo e alma à realização de suas declarações. "Por que é", indagou ele certa vez, "por que é que os melhores tem sempre de tombar? Será que porque dar até o último grama de sua força, é que eles são os melhores?"

    Em 1949 os restos de Herzl foram trazidos a Israel e reenterrados numa elevação diante de Jerusalém que recebeu o nome de Monte Herzl. O Estado Judeu havia trazido de sua imaginação para o mundo da realidade. Seu semblante grave e nobre tornou-se um símbolo da soberania que ele buscara com fé desesperada mas constante.