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RABI AKIVA


 Rabi Akiva é considerado por muitos o maior de todos os rabinos no judaísmo. As razões para tamanho reconhecimento são diversas, mas procuraremos resumi-las da melhor maneira possível para que se possa conhecer um pouco mais desse grande chacham (sábio).

    A conexão profunda de Akiva com a Torá começa por exigência de Rachel. Ela era a filha de Kalba Savua, um homem muito rico de Ierushalaim(Jerusalém) e também patrão de Akiva. Para que se casem, Rachel exige que Akiva dedique sua vida ao estudo da Torá. Como um homem de 40 anos, pobre e analfabeto, poderia se tornar um grande estudioso de Torá? A mesma pergunta permeou os pensamentos de Akiva, mas um corriqueiro evento trouxe-lhe respostas. Certo dia, Akiva percebeu que gotas de água perfuravam uma pedra ao caírem sobre ela. Prontamente concluiu: “Se a água, que é tão mole, pode furar uma pedra dura, as palavras da Torá – que são tão concretas – certamente poderão deixar sua marca em meu coração sensível.” A partir desse momento, Akiva abraça o estudo da Torá, casando-se com Rachel. A união não agrada a Kalba Savua e o casal vive na pobreza, sem ajuda financeira. Futuramente, Savua se reconciliaria com o casal e lhes presentearia com uma parte de sua fortuna.

    Rabi Akiva afasta-se temporariamente da esposa para estudar na Academia de Yavne. Depois da destruição de Ierushalaim, Rabi Yohanan Ben Zakai transferira o Sanhedrin (a suprema corte judaica) para Yavne, cidade que se tornou o centro de estudos do judaísmo. Lá, Akiva estudou com grandes chachamim por doze anos, retornando para casa acompanhado de 12 mil alunos. Ouvindo sua mulher afirmar a uma vizinha que aguentaria mais doze anos longe do marido para que este estudasse Torá, Akiva retorna para a yeshivá(centro de estudos judaicos) em Yavne. Outros doze anos se passam até que o Rabi retorne para sua mulher, dessa vez acompanhado de 24 mil alunos. Nesse episódio, Rachel se prostra aos pés de Akiva, ao passo que os alunos, desconhecendo ser aquela a esposa do Rabi, tentam impedi-la. Rabi Akiva alerta seus alunos: “O que hoje possuo e do qual todos vocês desfrutam, somente pude conquistar graças a ela”.

    Este episódio tem grande representatividade para o judaísmo. Muitas pessoas que não conhecem o judaísmo a fundo interpretam traços da cultura judaica como sendo machistas, opressivos para com as mulheres. A mulher no judaísmo tem papel central, sendo muito valorizada. Ninguém melhor que o maior rabino da história judaica para afirmar esse papel em palavras.

    Foi Rabi Akiva quem iniciou o trabalho de classificação de cada uma das leis da Torá Shebeal Pê (Torá Oral) de acordo com seus teores. Era o início de um trabalho que culminaria com a compilação da Mishná (parte do Talmud) por Rabi Yehuda HaNassi.

    Akiva ben Yossef (nosso Rabi em questão) gozava de grande prestígio junto ao Sanhedrin. Assistia às sessões da corte judaica frequentemente e era referência para assuntos de Halachá (Lei Judaica). Uma passagem conta que certa feita o Rabi chegou atrasado a uma sessão e ficou aguardando do lado de fora. Alguém anunciou, então, dentro da sala de reuniões: “A Torá se encontra lá fora”. Somente com a entrada do grande tzadik (justo), tomou prosseguimento a sessão.

    Akiva dizia que em benefício do próprio D'us Ele escolhera os judeus, entre todas as nações, pois os outros povos louvavam seus deuses na prosperidade e os amaldiçoavam quando sua sorte lhes dava as costas. Os judeus, entretanto, ensinava o Rabi, sempre louvam a D'us, quer na prosperidade quer na penúria.

    Um princípio muito valorizado no Cristianismo e cuja citação é atribuída a Jesus vem na verdade do judaísmo e foi celebrado já por Rabi Akiva. Nosso sábio afirmava que a essência de todo o judaísmo e de sua Torá podia ser definida em um só de seus versos: “E amarás o teu próximo como a ti mesmo.” [Vaikrá(Levítico), 19:18]. O judaísmo está alicerçado em relações de amor para com o próximo, e a palavra amor pode tomar as mais diversas conotações.

    Akiva era conhecedor de diversas ciências, como medicina e astronomia. Falava várias línguas e tinha como princípio valorizar muito a vida. Houve episódio em que chegou a afirmar que se fosse um magistrado, jamais condenaria alguém à pena capital.

    O Talmud conta que Rabi Akiva foi um dos quatro únicos sábios que adentraram o Pardes(jardim, dimensão mística) ainda em vida e desfrutaram do Olam Habá (Mundo Vindouro). Três deles não suportaram- enlouqueceram ou morreram- mas Akiva retornou intacto.

    É famosa a seguinte história sobre o chacham. Seu mestre, Rabi Eliezer ben Hircano, levantou-se de um dia de jejum para entoar a prece pela chuva. Recitou 24 bênçãos, mas nenhum pingo se viu. Rabi Akiva acercou-se, então, do púlpito e exclamou: "Avinu Malkenu, nosso Pai, nosso Rei: não temos outro rei além de Ti. Nosso Pai, nosso Rei, age por Tua causa e tem misericórdia de nós". De imediato, os pingos de chuva caem sobre eles. Mas a história não termina aí. O povo judeu adotou sua prece e, até os dias de hoje, recitamos o mesmo rogo nos jejuns coletivos, em Rosh Hashaná (Ano Novo judaico) e durante os Yamim Noraim (Dias Terríveis), que culminam em Yom Kipur(Dia do Perdão).

    O Kadish foi concebido por Rabi Akiva. Estes versos, recitados em várias Tefilót(rezas),foram instituídos também para a celebração da memória dos falecidos. O Kadish não cita a morte em nenhuma de suas passagens.

    Akiva ben Yossef passou a Torá Shebeal Pê a seus pupilos, que vieram a ser grandes sábios do judaísmo: Rabi Meir Baal HaNess - o Mestre dos Milagres - e Rabi Shimon Bar Yochai - autor do Zohar, o Livro do Esplendor, que sistematizou e começou a divulgar a sabedoria da Cabalá(misticismo judaico).

    Rabi Akiva estava vivo quando da destruição do segundo Beit HaMikdash (Templo Sagrado). Testemunhou, ainda, a famosa Revolta de Bar Kochba. Nessa revolta, o general Shimon Bar Kochba rebelou-se contra Roma em Betar, uma cidade de Eretz Israel. Pelo sucesso inicial do general, Akiva chegou a proclamá-lo como o Mashiach (Messias). Bar Kochba, entretanto, foi derrotado e morto.

    A história de Rabi Akiva ainda explica mais costumes judaicos. Uma peste assolou os discípulos do Rabi nas semanas entre Pessach e Shavuót, quando fazemos a Sefirat HaÔmer(contagem do Ômer). Milhares morreram. Durante esse período, costumamos nos privar de realizar casamentos, de cortar os cabelos e de escutar música, justamente em sinal de luto por esses mortos. Em Lag BaÔmer(33º dia de Ômer) comemoramos também o fim das mortes dos discípulos de Akiva.

    Rabi Akiva, após a queda de Betar, foi preso e condenado à morte pelos romanos. Foi mais um episódio da história judaica em que um homem morreu pelo seu amor ao judaísmo, pela sua condição de judeu. Akiva ensinava Torá aos judeus mesmo sob a proibição de tal ação pelos dominadores romanos. Sua luta pela continuidade do judaísmo lhe custou a vida. O Rabi foi esfolado vivo até perecer. Rabi Akiva (Z”L) foi enterrado em Tiberíades.

    PASSAGEM DO TALMUD REFERENTE AO RABI AKIVA

    Talmud Bablí (Talmud Babilônico), Massechet(Tratado) Menahot 29b

    “Quando Moshé(Moisés) ascendeu ao céu, encontrou o Santo-Abençoado seja Ele [D’us] – ocupado em adicionar coroas (detalhes) às letras [do Tanach(Bíblia)]. Disse Moshé: “Senhor do Universo, quem detém Sua mão?” [significando: há algo faltando na Tora que torna estas adições necessárias?]. Ele respondeu: “Levantar-se-á um homem, no final de muitas gerações, Akiva ben Yossef (Rabi Akiva) é seu nome, que esclarecerá cada detalhe das Halachót. Disse Moshé: “Senhor do Universo, permita-me vê-lo”. Ele respondeu: “Vire-se”. Moshé foi e sentou-se atrás da oitava fileira [de estudantes na yeshivá de Rabi Akiva, enquanto este falava sobre Halachá].Não podendo acompanhar as argumentações, Moshé sentiu-se desconfortável. Mas quando chegaram a um certo assunto e os discípulos perguntaram ao mestre de onde ele sabia isso, ele [Akiva] respondeu: “É uma lei dada a Moshé no Sinai”. E ele [Moshé] sentiu-se confortado.”

    Esta famosa Hagadá continua da seguinte maneira:

    “Por causa disto, ele [Moshé] retornou ao Santo-Abençoado seja Ele[D’us] – e disse: “Senhor do Universo, Tu tens tal homem [à disposição] e deste a Tora através de mim!”.Ele respondeu: “Silêncio, pois este é o Meu decreto!”. Então disse Moshé: “Senhor do Universo, mostraste-me sua [de Akiva] Tora, mostre-me [agora] sua recompensa”. “Vire-se”, Ele disse. Moshé virou-se e viu-os pesando a carne dele [de Akiva, após ser morto pelos romanos] no açougue. Gritou Moshé: “Senhor do Universo, esta é a Tora e esta é a recompensa!”. Ele respondeu: “Silêncio, pois este é Meu decreto!”.”

    Referências:

    • Revista Morashá

    • Traduções do Talmud de Ariel Finguerman

    • Artigos do Chabad Brasil

    • Shulchan Aruch traduzido para o espanhol