Biografias

MARTIN BUBER (1878-1965)



        Martin Buber nasceu em Viena, em 1878, filho de Carl Buber e Elise Née Wurgast. Seus pais se separam quando Buber tinha quatro anos e ele viveu os próximos dez anos com seus avós paternais, Salomão e Adela, em Lvov, na Polônia. Seu avô era um adepto da Haskalá que considerava-se um polonês de fé judaica, mas que mesmo assim era muito respeitado, até pelos ultra-ortodoxos, o que abriu portas para Martin Buber quando ele começou a interessar-se por Sionismo e pela literatura Chassídica.

            Martin Buber foi educado em casa e conviveu, em sua infância, com uma variedade de idiomas locais que facilmente absorveu (hebraico, ídishe, polonês, alemão). Mais tarde, adquiriu outros idiomas também (grego, francês, italiano, inglês e latim).

            Em 1900, após concluir seus estudos, Buber e sua esposa, Paula Winker mudaram-se para Berlim, onde conheceram o anarquista Gustav Landauer, um dos melhores amigos do casal. Landauer foi muito importante na vida de Martin Buber quando em 1916 ele criticou Buber por seu entusiasmo público com o esforço de guerra alemão. Esta crítica advinda de um amigo íntimo desviou-o de um misticismo social estatizante para a filosofia do diálogo.

            Martin Buber foi um dos mais importantes filósofos judeus do século XX. Tal era o poder de sua palavra escrita e oral que, durante a Primeira Guerra Mundial, muitos jovens escreveram-lhe procurando ajuda em difíceis crises morais, religiosas e políticas. Suas respostas eram vistas como as de uma autoridade que estava acima das ideologias da época.

            Influenciado por Kant e Nietzsche desde pequeno e, mais tarde, por Achad Ha’Am, acabou abandonando grande parte das influências nietzschianas, mas carregou seu estilo profético de escrita pro muito tempo. As idéias de Martin Buber eram reconhecidas, pelo próprio Buber, como utópicas, mas ele as manteve até o final de sua vida. Buber era um sionista utópico e, no campo das idéias políticas, tinha preferência pelo anarquismo e pelo socialismo.

            Buber acreditava que deveria ser criado, na Palestina um estado bi-nacional (judeu e árabe). Seu engajamento com o movimento sionista variou muito desde que aderiu a este. Apesar de nunca ter cessado de escrever e falar sobre o assunto, passou mais de dez anos sem participar ativamente do movimento enquanto organização política, restringindo-se à busca de fundações psicológicas fortes com as quais diminuir a distância entre “política real” e a tradição teológica-política judaica.

Em 1921, no entanto, participou do Congresso Sionista de Carlsbad como delegado do movimento juvenil HaShomer Ha’Tzair e, em 1928 e 29, nos debates que se seguiram em relação à armar ou não os chalutzim, optou pelo pacifismo.

Em nenhum momento Buber alimentou qualquer esperança de que suas visões políticas pudessem arrebatar a maioria, mas ele acreditava que era importante articular a verdade moral de seu próprio ponto de vista ao invés de esconder suas verdadeiras crenças em prol de uma estratégia política. Esta autenticidade não rendeu a Buber muitos amigos.

Em 1937, Buber imigrou para a Palestina, filiando-se à Universidade Hebraica de Jerusalém, onde lecionou filosofia.

Martin Buber é muito conhecido por sua principal obra filosófica “I and Thou” (Eu e Tu), publicada em 1923. Apesar de muito criticado por seu amigo Walter Kaufmann, que ajudou a popularizar a obra de Buber nos Estados Unidos, “Eu e Tu” é a obra mais importante de um dos mais importantes filósofos judeus do século passado e está profundamente marcada pelo Judaísmo.

Buber insistia que o princípio dialógico não era uma concepção filosófica, mas uma realidade além do alcance da linguagem discursiva. A partir disto - a dualidade – o filósofo simplificou a duas as relações básicas humanas (este é o maior motivo das críticas à obra) : relações Eu-Isto e relações Eu-Tu.

De acordo com Buber, freqüentemente julgamos tanto as pessoas quanto os objetos por sua função. Isto pode ser útil: para um médico, ao examinar um paciente a procura de doenças específicas, é melhor que ele veja o paciente como um organismo e não como indivíduo; cientistas podem aprender muito sobre nosso mundo observando-o, medindo-o, examinando-o, testando-o. Para Buber, todas estas são relações Eu-Isto.

Infelizmente, vemos as pessoas do mesmo modo na maioria das vezes. Ao invés de nos tornarmos completamente acessíveis, compartilhando totalmente, realmente conversando, compreendendo o outro, nós os observamos ou mantemos parte de nós mesmos fora do momento da relação. Nós fazemos isto para proteger nossas vulnerabilidades ou para fazer com que eles respondam de alguma maneira pré-concebida, para conseguir alguma coisa. Para Buber, estas também são relações Eu-Isto.

Em oposição às relações Eu-Isto, Buber posiciona a relação Eu-Tu, uma relação ideal. Estas relações ocorrem quando se está completamente imerso na relação, realmente entendendo e “estando lá” com outra pessoa, sem máscaras, pretensões, falsidades, até mesmo sem palavras. Este é o momento da relação Eu-Tu. O vínculo criado entre duas pessoas por uma relação deste tipo engrandece cada uma das duas. Cada uma tenta aprimorar a outra, o resultado disto é o diálogo verdadeiro, o compartilhamento verdadeiro.

Estas relações não são constantes nem estáticas. As pessoas entram e saem de relações Eu-Tu e Eu-Isto. Ironicamente, tentar atingir uma relação Eu-Tu falhará porque o processo da tentativa torna esta um objeto e, portanto, a única relação que se estabelece é Eu-Isto. Até mesmo descrever o momento objetifica-o e torna-o Eu-Isto. Buber diz que uma pessoa sabe quando está num momento Eu-Isto e que por não poder descrever esta relação pode somente encorajar as pessoas a estarem abertas a elas. Para Buber é possível também estabelecer uma relação Eu-Tu com o mundo e com os objetos. Pode-se estabelecer um diálogo verdadeiro com as artes, música, poesia, etc.

A partir deste ponto, parte da teoria de Buber pode ser interpretada por alguns como mística e neoplatônica. Traços disto se manifestam já nas características das relações Eu-Tu. Para Buber, Deus é o Tu Eterno. Ao tentar provar a existência de deus, os filósofos racionalistas iniciaram uma relação Eu-Isto.

Deus é indefinível, não se pode estabelecer condições, pré-requisitos para a relação. Nós temos apenas que acreditar e estar abertos à relação com o Tu Eterno e quando experimentamos esta relação Eu-Tu, o momento não precisa de palavras. Na verdade, para Buber, os momentos mais intensos que experimentamos com outras pessoas ocorrem sem palavras, mas Buber considera que a intensidade da experiência é insignificante.

Buber, apesar do que aparenta, não encorajava momentos místicos – a relação Eu-Tu mudava os compartilhantes, mas isto acontecia tão naturalmente que algumas vezes era quase imperceptível. Para Buber é possível ter uma relação Eu-Tu com Deus através de relações Eu-Tu com pessoas, animais, a natureza, as artes, o mundo.

Finalmente, Buber apresenta uma visão judaica do momento Eu-Tu. Após nossa redenção do Egito, o povo hebreu encontrou Deus. Estávamos abertos e disponíveis e o momento Sinais foi um relação Eu-Tu do povo inteiro com o Tu Eterno. A Torá, os profetas e nossos textos rabínicos foram todos escritos por humanos expressando o Eu-Tu com o Tu Eterno. Lendo estes textos e estando abertos à relação inerente a eles, é possível que nos tornemos disponíveis para uma relação Eu-Tu com o Tu Eterno. Nós devemos nos apresentar sem preconceitos, sem expectativas que limitariam a relação, tornado-a Eu-Isto. Se tentarmos analisar o texto, novamente criamos uma relação Eu-Isto porque a análise nos posiciona fora do texto, como observador e não como participante completo.

Para Buber, uma ação levada a cabo porque havia sido previamente legislada não continha sentido. Apenas as respostas aos momentos Eu-Tu podem ter significado. Por isto, Buber discordava da importância da prática da tradição no dia-a-dia, era suficiente responder ao Eu-Tu em qualquer momento que ele criasse.

Martin Buber morreu no ano de 1965.